quinta-feira, 11 de junho de 2009





"Fico tão cansada às vezes,
e digo para mim mesma que está errado,
que não é assim, que não é este o tempo,
que não é este o lugar, que não é esta a vida.
(...)então eu não sentia nada, podia fazer as
coisas mais audaciosas sem sentir nada,
bastava estar atenta como estes gerânios,
você acha que um gerânio sente alguma coisa?
quero dizer, um gerânio está sempre tão
ocupado em ser um gerânio e deve ter tanta
certeza de ser um gerânio que não lhe sobra
tempo para nenhuma outra dúvida..."

Caio Fernando Abreu




"Mas se eu tivesse ficado, teria sido diferente?
Melhor interromper o processo em meio:
quando se conhece o fim, quando se sabe
que doerá muito mais -por que ir em frente?
Não há sentido: melhor escapar deixando
uma lembrança qualquer
,
lenço esquecido numa gaveta, camisa jogada
na cadeira, uma fotografia –qualquer coisa
que depois de muito tempo a gente possa
olhar e sorrir, mesmo sem saber por quê.
Melhor do que não sobrar nada, e que esse
nada seja áspero como um tempo perdido.
Eu prefiro viver a ilusão do quase, quando estou
"quase" certa que desistindo naquele momento
vou levar comigo uma coisa bonita.
Quando eu "quase" tenho certeza que insistir naquilo
vai me fazer sofrer, que insistir em algo ou alguém
pode não terminar da melhor maneira, que
pode não ser do jeito que eu queria que fosse,
eu jogo tudo pro alto, sem arrependimentos futuros!
Eu prefiro viver com a incerteza de poder
ter dado certo, que com a certeza de ter acabado em dor.

Talvez loucura, medo, eu diria covardia, loucura quem sabe!”

Caio Fernando Abreu





Ah: fumarás demais,
beberás em excesso,
aborrecerás todos os
amigos com tuas histórias
desesperadas, noites e noites
a fio permanecerás insone,
a fantasia desenfreada e o sexo
em brasa, dormirás dias adentro,
faltarás ao trabalho, escreverás
cartas que não serão nunca enviadas,
consultarás búzios, números, cartas e
astros, pensarás em fugas e suicídios
em cada minuto de cada novo dia,
chorarás desamparado atravessando
madrugadas em tua
cama vazia, não conseguirás
sorrir nem caminhar alheio pelas ruas
sem descobrires em algum jeito alheio o
jeito exato dele, em algum
cheiro o cheiro preciso dele.

Caio Fernando Abreu